5 de setembro de 2012

Setembro - Mês da Bíblia



Estamos celebrando os 50 anos da abertura do Concílio Vaticano II (1962-1965) que deu inicio a um novo tempo da Igreja. Um dos elementos mais importantes deste evento foi, sem dúvida nenhuma, a colocação da Palavra de Deus no coração da Igreja, com o se expressa o Documento sobre a Revelação: A Igreja sempre venerou as divinas Escrituras, como também o próprio corpo do Senhor, sobretudo na sagrada liturgia, nunca deixou de tomar e distribuir aos fiéis, da mesa tanto da palavra de deus como Do corpo de Cristo, o pão da vida” (Dei Verbum, 21).

Com efeito, para a Igreja, a Bíblia é a carta que Deus Pai envia a seus filhos, pois “nos Livros Sagrados, o Pai que está nos céus vem amorosamente ao encontro de seus filhos, a conversar com eles” (DV, 21).

O Concílio pediu que “os fiéis tenham amplo acesso à Sagrada Escritura”, pois “a Palavra de Deus deve estar sempre a o dispor de todos e em todos os tempos” (DV, 22). De fato, depois do Concílio Vaticano II, houve na Igreja Católica um grande despertar para a Palavra de Deus; parece que a profecia de Amos se realizou: Dias virão - oráculo do Senhor – em que vou mandar a fome sobre o país: não será fome de pão, nem sede de água, e sim fome de ouvir a Palavra de Javé” (Am 8, 11).

1. O QUE A BÍBLIA DIZ DA BÍBLIA
- O Antigo Testamento considera o povo de Deus como convocado pela Palavra e animado e orientado pela Palavra.

Ouvi, Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor... Que estas palavras que hoje te ordeno estejam gravadas em teu coração! Tu as inculcarás aos teus filhos, e delas falaras sentado em tua casa e andando em teu caminho, deitado e de pé. Tu as atarás também à tua mão como um sinal, e serão como um frontal entre teus olhos; tu as escreverás nas entradas da tua casa e nos portões da tua cidade” (Dt 6, 4-7; 32, 46-47). E o Salmo 119 parece fazer eco: No silêncio da noite medito tua palavra... Levanto-me no meio da noite para ler tua palavra ... Acho consolo em tua palavra ... Meditarei tua palavra  ... Desejo tua palavra ... Tua palavra faz minhas delícias dia e noite medito tua palavra ... Tua palavra é lâmpada para os meus pés, é luz para o meu caminho”.

- O Novo Testamento nos apresenta Deus Pai como um comunicador, por isso fala. A carta aos Hebreus nos lembra que Deus falou de tantas formas e, nestes últimos tempos, nos falou no seu Filho (Hb 1,1-2): então, a Palavra é Jesus. Por isso, mais do que uma religião do livro, a cristã é uma religião da palavra, e esta Palavra é uma pessoa, a Pessoa de Jesus, a revelação total e definitiva de Deus: depois de Jesus o Pai não tem mais nada para nos dizer! Ele, Jesus, é o grande sinal e a expressão visível do seu amor (Jo 3, 16). 

A Bíblia, por ser a Palavra de Deus, tem uma particular capacidade educativa de correção e de ensino. "Quanto a ti, permaneça firme naquilo que aprendeste e aceitaste como verdade. E sabes de quem o aprendeste! Desde criança conheces as Escrituras Sagradas. Elas têm o poder de lhe comunicar a sabedoria que conduz à salvação pela fé em Cristo Jesus. Toda Escritura é inspirada por Deus e é útil para ensinar, para argumentar, para corrigir, para educar conforme a justiça. Assim o homem de Deus estará capacitado e bem preparado para toda obra boa” (2Tm 3, 14-17).

A segunda carta de Pedro nos alerta sobre a importância da Palavra de Deus que deve ser colocada “diante dos olhos como uma lâmpada que brilha”, e sobre o modo de lê-la e interpretá-la, pois “nenhuma profecia da escritura resulta de interpretação pessoal” (2Pd 1, 19-21). São Pedro chama a atenção sobre a distorção que alguns estavam fazendo de certas passagens difíceis das cartas de São Paulo, como faziam também com as demais Escrituras (2Pd 3,16). A Bíblia deve ser lida com o coração da Igreja porque, como afirma Concílio Vaticano II, “O patrimônio sagrado da fé, contido na Tradição e na Sagrada Escritura, foi confiado pelos apóstolos à totalidade da Igreja” (Catecismo da Igreja Católica, nº 84.).

2. O QUE JESUS DIZ DA BÍBLIA
Jesus está no centro da Bíblia. Nele a Palavra de Deus deixa de ser promessa e se torna pessoa: “A Palavra de Deus se fez homem e habitou entre nos” (Jo 1,14).

Neste sentido, como diz o Apocalipse, somente Jesus é capaz de “abrir” a Bíblia: “Quem é capaz de romper os selos e abrir o livro? ... Ninguém nem no céu nem na terra ... Então o cordeiro recebeu o livro ... os anciãos ajoelharam-se ... e entoaram um cântico novo: “Te és digno de receber o livro e abrir seus selos” (Ap 5,1-9): é Jesus que nos abre as Escrituras: “Começando por Moisés e continuando por todos os profetas, Jesus explicava para os discípulos as escrituras que falam a respeito dele” (Lc 24, 27). É somente Jesus que é “digno de receber o livro e abrir seus selos” (Ap 5, 9 ), e de explicar as Escrituras (Lc 4, 32).

A propósito da escuta da Palavra, Jesus, contando uma parábola, afirma a necessidade de não só ouvir a Palavra de Deus, mas de colocá-la em prática (Mt 7, 24). E quando quer proclamar a sua missão na sinagoga de Nazaré, se apresenta como Aquele que realiza a Palavra de Deus: recorrendo à famosa passagem de Isaias 61,1-2 conclui, com indiscutível autoridade, que escandaliza os presentes: “Hoje se cumpriu esta passagem da Escritura que acabam de ouvir “(Lc 4, 21).

3. O QUE A IGREJA DIZ DA BÍBLIA
Já vimos como o Concílio recomendou que a Sagrada Escritura chegasse às mãos do Povo de Deus. Os Bispos que participaram deste Concílio pediram que todos mantenham contato íntimo com as Escrituras, mediante leitura assídua e estudo profundo... do mesmo modo, o sagrado Concílio exorta, de maneira insistente e particular, todos os fiéis ... a que aprendam a “eminente ciência de Jesus Cristo (Fl 33,8) com a leitura freqüente das divinas Escrituras”, e repetindo uma frase de São Jerônimo, concluíram que o “desconhecimento das Escrituras é desconhecimento de Cristo (DV, 25).

Este contato íntimo somente pode se dar quando temos uma leitura assídua da Palavra de Deus, por isso se recomenda que todas as famílias tenham a Bíblia em casa e que pratiquem a leitura cotidiana da palavra de Deus.

A partir do último Sínodo dos Bispos em Roma, sobre a Palavra de Deus na vida e na missão da Igreja, o papa Bento XVI escreveu uma Exortação ao Povo de Deus, onde, entre outras coisas, recomenda a formação bíblica dos cristãos que exige investimento seja por parte da paróquia com a animação bíblica da pastoral, seja da diocese através dos centros de formação. Este tema é ainda retomado pelo documento quando o papa fala do matrimônio e família (Verbum Domini, respectivamente nos números 84 e 85). O papa lembra que a obrigação de difundir o Evangelho nos vários âmbitos da vida, deriva do batismo, “através de uma vida cristã mais consciente e capaz de dar ‘razão da esperança’ que vive em nós (1Pd 3,15)”. Isso implica na necessidade de ter “uma familiaridade com a Palavra de Deus”.

É na palavra de Deus, diz o Papa, que a família encontra sua identidade, pois ela está na origem do matrimônio (Cfr. Gn 2,24) e o próprio Jesus deu atenção especial ao matrimônio, sublinhando sua indissolubilidade e reconduzindo-o ao plano originário de Deus. (Mt 19,4-8). Por isso, a Palavra de Deus se torna “um amparo precioso inclusive nas dificuldades da vida conjugal e familiar” (Verbum Domini, 85).

4. OS EFEITOS DA PALAVRA DE DEUS NA VIDA DO CRISTÃO
São Paulo, na 1ª Ts, afirma que a Palavra de Deus “age com eficácia” (2,13) e na 2ª Tm explica os motivos que nos levam à leitura da Sagrada Escritura, pois ela tem o poder de comunicar a sabedoria que conduz à salvação, e é útil para ensinar, para argumentar, para corrigir, para educar conforme a justiça, e tornar o batizado capacitado e bem preparado para toda obra boa (3, 14-17).

Podemos considerar alguns efeitos que a leitura e a meditação da Palavra produzem na vida do cristão:

- Alegria para o coração e luz que ilumina. É o que expressa a bela passagem de Jeremias: “Quando recebi as tuas palavras, eu as devorava. A tua palavra era festa e alegria para o meu coração, porque eu levava o teu nome, Senhor, Deus dos exércitos”. (Jr 15,16). É uma riqueza para a vida do crente, porque “ela alegra o coração” (Sl 119, 111), assim como o coração dos discípulos de Emaús “ardia” em quanto Jesus lhes explicava as Escrituras que falavam a respeito dele (Lc 24, 27). A Palavra de Deus é como “um facho que ilumina nossos passos”, e no momento de dificuldade podemos continuar confiando nela (Sl 119, (Sl 119, 42. 69.74.81).

- Alimento para o espírito: “O homem não vive só de pão, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”, expressão presente no Antigo Testamento (Dt 8,30 e retomada por Jesus (Mt 4,4). O Instrumento de trabalho para ao Sínodo se 2008 sobre Palavra de Deus, cita duas significativas expressões de autores clássicos: Walstramus não hesita em afirmar que “Também a Escritura de Deus considera-se Corpo de Cristo”, e Orígenes: “Considero o Evangelho o Corpo de Cristo”. Por outro lado a idéia da “mesa da Palavra” dentro da Eucaristia é bem antiga na Igreja.

- A presença de Deus. Desde sempre, a leitura das Sagradas Escrituras fez parte integrante da liturgia cristã. A razão está no fato de que a Liturgia, sobretudo a celebração da Eucaristia, realiza atualizando aquilo que os textos da Bíblia falam e anunciam. No Missal Romano n. 33 encontramos esta bela afirmação: nas leituras, “Deus dirige a palavra a seu povo”, com efeito, no texto revelado - já tinha afirmado o Concílio Vaticano II - é o próprio Pai celeste que vem amorosamente ao nosso encontro e se entretém conosco manifestando-nos a natureza do Filho unigênito e seu designo de salvação para a humanidade (Dei Verbum, 25.35). Se é Deus que nos fala, significa que ele está presente na Palavra proclamada.

- A presença de Jesus. O Concílio O Vaticano II fala também da presença de Jesus, sobretudo nas leituras da liturgia. Quando a comunidade se reúne para celebrar, Cristo está “presente em sua palavra, pois é ele mesmo quem fala quando as Escrituras são lidas na Igreja” (Sacrosantum Concilium, 7). A dimensão cristológica da Sagrada Escritura é fundamental para os cristãos, pois é a pessoa de Cristo que “recapitulou em si toda a longa série dos homens, dando-nos em resumo a salvação”, com se expressa Santo Irineu de Lion (Contra os hereges, III, 18,1).

Mês da Bíblia é mais uma oportunidade para nos abeirarmos da Palavra de Deus, e nos deixarmos moldar pela sua força. Com um abraço,

Pe. Vicente Frisullo, O.SS.T

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